Olá,
Na semana passada, eu e mais cinco amigos da minha universidade fomos até ao Norte da Suécia, onde ficamos quatro noites.
A viagem começou na cidade universitária de Lund, no extremo Sul da Suécia, de onde partimos de comboio de manhã bem cedo em direcção a Estocolmo e, depois, para o aeroporto de Arlanda. Em Lund o tempo estava frio, cerca de -7ºC, mas muito menos do que iríamos depois encontrar no Norte. Todo o território da Suécia estava coberto de neve, de uma ponta a outra, como pudemos ver durante a viagem. A viagem até à estação central de Estocolmo demorou pouco mais de 4 horas. Já em Arlanda, partimos num voo da SAS para Kiruna a meio da tarde. Esta cidade fica no extremo Norte da Suécia, na Lapónia, a uma latitude de 67º50’N e, portanto, já para lá do círculo polar árctico. É interessante que a distância desde Lund, no Sul, até ao extremo Norte da Suécia é exactamente a mesma que de Lund até Roma, quer de avião (em linha recta), quer por estrada.
O voo, num Boeing 737-600 praticamente cheio, foi normal, demorou cerca de 1:30, e aterramos em Kiruna à hora prevista, por volta das 16:30. Este aeroporto tem só seis voos regulares por dia: três partidas e três chegadas de Arlanda, todos com a SAS. Aproveito para dizer que a SAS tem preços especiais, e fixos (apenas dependendo da disponibilidade), para menores de 26 anos em todos os voos. À chegada a Kiruna estava a nevar e a temperatura era de -12ºC, o que não é muito para aquele sítio nesta altura do ano. Esta cidade é conhecida pelas minas de ferro a céu aberto, que são das maiores do mundo.
De Kiruna fomos até Abisko (latitude: 68º20’N), uma pequena localidade junto a um grande lago - o Torne-träsk - e rodeada de montanhas, que fica a cerca de 100 kms a Noroeste de Kiruna, em direcção à fronteira com a Noruega. Fica no meio do nada. Passamos lá três noites, num pequeno hostel, que nem sequer tinha chaves nem fechaduras, nem nos quartos, nem na porta de entrada. Nunca tinha visto uma aldeia como esta. Não tinha um centro, uma praça, um sítio onde as pessoas se pudessem encontrar. Tudo o que havia era uma estação de comboio (muito grande para a dimensão da povoação - com cerca de 85 habitantes), uma escola (que me pareceu totalmente vazia), um supermercado (que também tinha caixas de correio no interior), uma esquadra da polícia, uma bomba de gasolina e um heliporto (ou um sítio para um helicóptero aterrar). Totalmente deserta, assemelhava-se a uma aldeia de um filme Western, mas coberta de neve. Há dois comboios por dia de Kiruna para Narvik, na Noruega, e que param em Abisko. São os únicos comboios de passageiros que servem a povoação. Para além destes, há muitos comboios de carga. Em Abisko, muitos habitantes têm trenós motorizados para as deslocações diárias. Nesta região, para além do Sueco, o Lapão (ou Sami) também tem estatuto de língua oficial.
Diz-se que devido ao lago e às montanhas que o rodeiam, criam-se condições para a ocorrência de um fenómeno raro, que faz com que o céu em Abisko esteja muitas vezes limpo, mesmo quando na região em redor está encoberto. Por isto, pela latitude e por praticamente não haver luzes no solo, Abisko é considerado um bom local para ver auroras boreais. Foi verdade. Vi auroras boreais todas as noites, mas a última foi a melhor. As fotos, sem tripé, não estão boas. Mas é algo que fica guardado na memória.
Lembro-me de uma história que um professor aqui na Suécia me contou. Ele viveu alguns anos nesta região e, num dia em meados dos anos 80, um grupo de pessoas que faziam hiking pelas montanhas encontrou destroços de um avião com restos mortais ainda presentes. Descobriu-se que se tratava de uma avião militar britânico da Segunda Guerra Mundial. Nunca ninguém tinha visto os destroços durante cerca de 40 anos! Dá para ter uma ideia da quão deserta a província de Norrbotten (esta região) é; onde, numa área maior que o território de Portugal, vivem apenas 250 000 pessoas e em algumas zonas da região a densidade populacional é menor que 1 habitante por km2. Em Portugal, a densidade populacional é de 115 por km2.
No segundo dia fomos até Narvik, na Noruega, de comboio desde Abisko. Foi talvez a viagem de comboio mais bonita que já fiz. A paisagem é espectacular e especialmente quando se começa a conseguir ver o fjord a aparecer no meio das montanhas.
O terceiro dia foi passado a fazer dogsledding e cross-country ski em Abisko. E, no penúltimo, fomos para Kiruna onde iríamos passar a noite, já que o voo de regresso a Estocolmo e à “civilização” no dia seguinte partia por volta das 7:00. Por isso, seria impossível ir de comboio desde Abisko até Kiruna nesse dia. Este foi o dia mais frio. Estavam -20ºC de manhã e a máxima não deve ter passado dos -17ºC. Mesmo assim, em Kiruna, as temperaturas chegam muitas vezes aos -35ºC no inverno. Chegamos a Kiruna ao início da tarde, vimos a cidade, que é pequena, e fomos até Jukkasjärvi visitar o hotel de gelo. Os bilhetes para visitar o hotel para estudantes custam 200SEK (cerca de 22 euros) mas vale a pena. É uma coisa única. Pode-se visitar o hotel livremente até às 18:00, incluindo quartos, que não têm portas, só uma cortina. A temperatura no hotel é mantida a -5ºC, o que nos pareceu “quentinho” quando lá entramos, já que no exterior estava muito mais frio. Ironicamente, mas ainda assim verdade, um guia da visita ao hotel disse-nos: "entrem e fechem a porta para não entrar frio". Claro que com esta temperatura no interior do hotel, não é possível haver casas de banho nos quartos, por exemplo. No entanto, há um edifício normal contíguo ao edifício em gelo que tem vários serviços de apoio. O hotel de gelo é construído novamente todos os anos, porque derrete no verão. Vários quartos são desenhados por artistas e quem quiser pode desenhar um quarto e candidatar-se para o ano seguinte. Há também uma capela em gelo que recebe o maior número de casamentos e baptizados em toda a Suécia.
No último dia, chegamos ao aeroporto de Kiruna um pouco antes da 6:00 e o terminal estava totalmente vazio. Não havia um funcionário sequer. Passado alguns minutos chegou uma funcionária da SAS para aceitar bagagem e mais passageiros foram chegando. O voo foi normal e depois de chegar a Arlanda apanhamos o comboio de regresso ao Sul. Por volta das 16:00 chegamos a Lund. Foi uma viagem única. Temos de agradecer à natureza pelo espectáculo que nos proporcionou.
